Microplásticos no cérebro? O alarmante achado da USP que expõe um risco invisível à nossa saúde

Vivemos cercados por plástico. Ele está nos utensílios de casa, nas embalagens dos alimentos, nas roupas, nos produtos de higiene, nos carros, nos aparelhos médicos. O que poucos imaginavam, até pouco tempo, é que partículas microscópicas desse material estariam se alojando até nos órgãos mais protegidos do corpo humano — como o cérebro.

Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) fizeram uma descoberta chocante: encontraram microplásticos no cérebro de oito pessoas que viviam na capital paulista. O estudo, conduzido por uma equipe multidisciplinar e apoiado pela FAPESP e pela ONG Plastic Soup Foundation, foi publicado na prestigiada revista científica JAMA Network Open.

Este achado levanta sérias questões sobre os impactos desses poluentes invisíveis à saúde humana e como eles estão penetrando nos sistemas mais sensíveis do nosso corpo. A seguir, você entenderá como os microplásticos chegam até nós, o que essa descoberta significa e quais os possíveis riscos para a saúde da população brasileira.

O que são microplásticos e onde eles estão?

Microplásticos são pequenas partículas de plástico com menos de 5 milímetros de diâmetro, invisíveis a olho nu. Eles podem ter formas de fragmentos, fibras, esferas ou filmes, e estão em todos os ambientes: água, solo, ar, alimentos e até bebidas. Foram identificados em mexilhões, frutas, legumes, cerveja, leite, chá, água engarrafada e até mesmo no ar das cidades.

Essas partículas são provenientes de duas fontes principais:

  1. Primárias: plásticos já fabricados em tamanho reduzido, como os usados em cosméticos e tintas.

  2. Secundárias: resultam da degradação de objetos maiores por ação do sol, do calor e da abrasão.

Segundo o biólogo Richard Thompson, que cunhou o termo “microplástico” em 2004, eles já foram encontrados em mais de 1.300 espécies de animais e, mais recentemente, em diversos tecidos e fluidos do corpo humano — como sangue, saliva, placenta e leite materno.

Leia mais: Você está comendo plástico e nem percebe: entenda os perigos invisíveis dos microplásticos

microplástico no cérebro

Imagem de microscopia de partícula de microplástico (azul) no pulmão (à esq.) e no tecido cerebral (à dir.) • Fernando Amato Lourenço / Universidade Livre de Berlim

A descoberta de microplástico no cérebro humano

A pesquisa da USP foi pioneira ao identificar microplásticos no bulbo olfatório — região do cérebro responsável por processar os cheiros. Essa parte do sistema nervoso central está localizada logo acima do nariz e está em contato direto com o ambiente externo por meio dos neurônios olfativos.

Para garantir que as amostras não fossem contaminadas, os pesquisadores utilizaram protocolos rigorosos: evitaram utensílios plásticos, usaram roupas de algodão, seringas de vidro e materiais limpos com água filtrada e acetona. As amostras foram congeladas e fatiadas em lâminas de apenas 10 micrômetros.

Posteriormente, elas foram analisadas no CNPEM (Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais), em Campinas, com o auxílio do acelerador de partículas Sirius. O equipamento permite identificar a composição química dos materiais com extrema precisão.

o que os microplásticos causam

Quais microplásticos foram encontrados?

Em cada amostra, os cientistas encontraram de 1 a 4 partículas com tamanhos variando entre 5,5 µm e 26,4 µm — tamanhos similares ao de muitas bactérias. As partículas estavam fragmentadas, algumas em forma de esferas e outras de fibras.

Os tipos mais comuns encontrados foram:

  • Polipropileno (PP) – 44% das amostras;

  • Polietileno (PE);

  • Poliamida (PA);

  • Polietileno acetato de vinila (PEVA).

Esses materiais estão presentes em fraldas descartáveis, máscaras, embalagens, utensílios domésticos, sacolas plásticas e roupas sintéticas.

Como os microplásticos entram no cérebro?

O cérebro é protegido por uma barreira biológica chamada barreira hematoencefálica, que impede a entrada da maioria das substâncias que circulam no sangue. Ainda assim, os microplásticos foram encontrados dentro de células ou próximos a vasos sanguíneos no cérebro.

Uma das hipóteses é que eles entrem pelas vias olfativas, atravessando a mucosa nasal e chegando diretamente ao bulbo olfatório. Outra possibilidade é que, ao serem inalados ou ingeridos, passem por processos de absorção no intestino ou pulmões e, em seguida, alcancem a corrente sanguínea.

microplástico no sistema nervoso

O que diz a ciência sobre os riscos?

Estudos com animais e células humanas em laboratório mostraram que micro e nanoplásticos podem causar:

  • Inflamações;

  • Danos celulares;

  • Estresse oxidativo;

  • Morte celular.

Esses efeitos podem prejudicar o desenvolvimento de órgãos ou afetar a regeneração dos tecidos. No entanto, ainda há muitas lacunas na pesquisa para afirmar com certeza quais são os impactos nos seres humanos.

O químico Henrique Eisi Toma, da USP, destaca: “O cérebro é o órgão mais blindado do corpo. Se microplásticos estão conseguindo atravessar essa barreira, devemos ficar atentos.”

Nanoplásticos: ainda menores, ainda mais perigosos

Enquanto os microplásticos variam entre 1 µm e 5 mm, os nanoplásticos têm menos de 1 µm (mil vezes menor que um milímetro). Eles têm tamanho similar ao de vírus e, por isso, conseguem interagir diretamente com as biomoléculas das células.

Um estudo preliminar da Universidade do Novo México (EUA) sugeriu que a concentração de micro e nanoplásticos no cérebro é até 20 vezes maior que no fígado e nos rins. E mais: essa concentração quase triplicou entre os anos de 2016 e 2024.

Efeitos cardiovasculares dos microplásticos: um possível alerta

Um dos estudos mais contundentes até o momento foi publicado na revista The New England Journal of Medicine em 2024. Pesquisadores italianos acompanharam 257 pacientes que haviam passado por cirurgia para remoção de placas de gordura nas artérias carótidas.

Nas placas de 150 pacientes foram encontrados microplásticos. Ao final do estudo, esse grupo apresentou um risco 4,5 vezes maior de infarto, AVC ou morte em comparação ao grupo sem microplásticos.

Embora o estudo não prove uma relação de causa e efeito, os autores levantam a hipótese de que essas partículas agravem a inflamação vascular, tornando as placas mais instáveis e propensas a romper.

O problema global — e crescente dos microplásticos

A produção global de plásticos ultrapassou 460 milhões de toneladas em 2019 e continua crescendo. Mesmo que fosse interrompida hoje, os microplásticos continuariam a se espalhar no ambiente por décadas.

A ONG Earth Action estima que 3,8 milhões de toneladas de micro e nanoplásticos cheguem aos oceanos todos os anos, enquanto 8,9 milhões atingem os solos.

Um tratado global contra a poluição plástica estava em discussão entre mais de 170 países, mas fracassou por pressão das nações produtoras de petróleo.

microplástico e demência

O que você pode fazer para reduzir a exposição

Embora seja praticamente impossível eliminar completamente o contato com microplásticos — já que eles estão no ar, na água, nos alimentos e até em produtos de higiene — é possível reduzir significativamente a exposição com atitudes simples no dia a dia.

Evite aquecer alimentos em plásticos

Panelas e utensílios de plástico, quando expostos ao calor do micro-ondas ou do fogão, liberam ainda mais partículas microscópicas. Prefira recipientes de vidro, cerâmica ou inox, principalmente para comidas quentes.

Escolha roupas de fibras naturais

Tecidos como algodão, linho e lã não liberam microplásticos nas lavagens. Já o poliéster, acrílico, nylon e até o jeans (que mistura algodão com poliéster) soltam milhões de microfibras plásticas a cada ciclo de lavagem. Prefira também sabões líquidos ecológicos e utilize sacos ou filtros que capturam essas microfibras na máquina de lavar.

Alimentos frescos sempre que possível

Produtos ultraprocessados e embalados em plásticos rígidos ou filmes transparentes (como bandejas de carne, queijos e congelados) podem liberar partículas no alimento, especialmente se expostos ao calor ou tempo excessivo de armazenamento.

Adote alternativas reutilizáveis

Substitua garrafas plásticas, copos descartáveis e canudos por versões de vidro, inox ou papel. Pequenas mudanças, como carregar sua própria garrafinha de água ou usar potes de vidro para armazenar alimentos, fazem diferença a longo prazo.

Cuide do que vai para a sua xícara

Um estudo de 2019 demonstrou que um único saquinho de chá de náilon ou poliéster pode liberar mais de 11 bilhões de partículas de microplástico quando mergulhado em água quente. Sempre que possível, prefira o chá a granel com infusores de metal ou vidro.

Plástico não é o inimigo: o problema é como o usamos

Para o químico Walter Waldman, da UFSCar, o plástico em si não é o vilão. O problema está no seu uso irresponsável e na cultura do descarte. “Plásticos salvam vidas, especialmente na medicina. Mas precisam ser usados com critério. O sistema está montado, e a indústria deve assumir sua parcela de responsabilidade”, afirma.

Medidas regulatórias, políticas públicas e incentivo à inovação em materiais alternativos também são urgentes. A redução da poluição por plásticos não depende apenas do consumidor, mas de toda a cadeia de produção.

A descoberta de microplásticos no cérebro humano feita pela USP representa um marco na pesquisa sobre os impactos da poluição plástica na saúde. Embora ainda não saibamos exatamente os efeitos dessas partículas no nosso organismo, os indícios são alarmantes.

Estamos expostos a um risco invisível, que se acumula silenciosamente dentro do nosso corpo. A ciência caminha para entender melhor o problema, mas enquanto isso, cada um pode fazer a sua parte para reduzir a exposição e cobrar políticas mais firmes para enfrentar essa crise global.

Este texto foi originalmente publicado por Pesquisa FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.

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